por Fernando Henrique Zanoni | 21 jan 2019 | Artigos
Após identificar quais são as empresas afetadas pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGDP), como manter uma estrutura de governança de dados dentro da organização, como preservar um inventário de dados pessoais e mecanismos de transferência, como implementar uma política de privacidade de dados e como a nova regulamentação influenciará nas rotinas, a Série “LGPD na Prática” desembarca no pilar treinamento e comunicação, capítulo no qual passarei a discorrer sobre a melhor forma de promover a conformidade com as normas internas e externas por meio da interação com os colaboradores e parceiros de negócios.
Promover uma cultura de privacidade e preservação de dados pessoais é um dos principais objetivos a serem atingidos no processo de adequação às novas regras, haja vista que sem a conscientização de todos os envolvidos é quase impossível fazer com que a organização cumpra com todas as obrigações legais. Conforme visto no início da série, é preciso envolver todas as áreas da organização, independente da existência de um Encarregado de Dados, estejam elas abrangidas ou não entre aquelas que ativamente tratam ou processam dados pessoais. Para tanto, sugere-se seja cumprido um cronograma interno de treinamento e comunicação e a melhor forma de fazê-lo passa por algumas etapas:
1. Preparar materiais com mensagens claras. Tanto no que concerne ao treinamento quanto à comunicação, é fundamental ir direto ao ponto. Nenhum colaborador ou parceiro de negócio precisa ser bombardeado com jargões jurídicos ou análises técnico-legislativas das regulamentações de proteção de dados. Deve-se certificar que a mensagem seja entendida por todos, ou seja, que cada um compreenda sua responsabilidade para com a privacidade e proteção de dados e como as novas regras impactarão suas suas atividades rotineiras. Trazer exemplos práticos, relacionados ao dia a dia da organização e voltados para as práticas de cada área mais sensível do negócio facilita qualquer explanação quanto à importância do engajamento de todos para que a organização cumpra com suas obrigações. Nesse sentido, sugere-se seja adotado um treinamento geral e breve, com um overview da nova regulamentação e/ou da política interna. Em paralelo, que seja adotada uma campanha de comunicação regular, promovendo os aspectos positivos da norma, utilizando editais, e-mails, videos, wallpapers, posts na intranet, etc.
2. Conceber uma abordagem específica para as áreas mais sensíveis. Para as funções nas quais o processamento e tratamento de dados faz parte das rotinas diárias, tais como nas áreas de marketing, RH e vendas, por exemplo, recomenda-se uma abordagem específica e um pouco mais técnica, baseada em riscos previamente identificados. Aconselha-se apresentar alguns cases de violações de dados, muito comuns nos dias atuais, e o impacto destas nas respectivas organizações.
3. Incorporar questões relacionadas ao tratamento e processamento de dados à integração de novos colaboradores. Além do treinamento específico, sugere-se que o tema seja tratado desde a integração dos colaboradores, logo no início da relação laboral, e assimilado pelo Programa de Compliance da organização.
4. Criar um cronograma para monitorar a regularidade dos treinamentos e das comunicações. Tanto no que concerne ao treinamento quanto às comunicações, criar um plano de ação é fundamental: Para tanto, as perguntas que devem ser respondidas são as seguintes: (i)”que objetivos deverá ser atingido antes da entrada em vigor da nova regulamentação?”; (ii) “quais são os diferentes públicos alvos e que mensagem passar a cada um deles?”; (iii) “que meios que serão utilizados para treinar os colaboradores e veicular as comunicações internas?”; e (iv) “em que período serão realizados os treinamentos e qual a programação das mensagens a serem veiculadas tanto ao público interno quanto ao externo?”; (v) “de quanto em quanto tempo serão realizados novos treinamentos, de modo que o discurso permaneça vivo dentro da organização?”. A partir das respostas deve-se criar um cronograma de atividades a ser gerenciado pelo Encarregado de Proteção de Dados.
5. Medir a participação e a efetividade dos treinamentos. Elaborar relatórios periódicos para determinar se os colaboradores e demais envolvidos em atividades relacionadas ao tratamento e processamento de dados participaram dos respectivos treinamentos. Sempre que possível, gerar evidências da efetividade dos treinamentos, por exemplo, através de questionários a serem aplicados ao término das apresentações. Ainda, sugere-se que seja implementado um sistema para avaliação do treinamento em si, de modo a avaliar a se a mensagem foi passada de forma clara ou se há algo a melhorar.
6. Fornecer treinamento qualificado para o Encarregado de Proteção de Dados. Nas situações em que o Encarregado de Proteção de Dados for colaborador da organização, sugere-se que este participe de treinamentos específicos de educação profissional, com viés técnico e jurídico, de modo a aperfeiçoar o Programa com base nas melhores práticas de mercado.
No próximo capítulo, irei discorrer sobre como gerenciar os riscos relacionados à segurança da informação.
Para acessar o primeiro capítulo da Série, clique aqui.
Para acessar o próximo capítulo, clique aqui.
por Fernando Henrique Zanoni | 18 jan 2019 | Artigos
Nos quatro primeiros capítulos da Série “LGPD na Prática” foi possível identificar quais são as empresas afetadas pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGDP), como manter uma estrutura de governança de dados dentro da organização, como preservar um inventário de dados pessoais e mecanismos de transferência e como implementar uma política de privacidade de dados.
Continuando com a proposta de esclarecer como a nova regulamentação influenciará nas rotinas da organização e a melhor forma de se preparar para cumprir com as novas obrigações legais, passo a exemplificar em que rotinas será necessário incorporar a privacidade de dados, sustentando procedimentos operacionais consistentes com as normas internas e externas e aos objetivos de gerenciamento de riscos:
1. Mapear os processos internos e aprimorar os controles de acesso. Conforme visto no capítulo anterior, deve-se revisitar ou implementar políticas e normas de conduta relacionadas à coleta, tratamento e guarda de dados pessoais, contudo a redação de documentos de nada adiantará se os processos e controles internos não respeitarem as regras criadas internamente e as regulamentações tais como a LGPD ou a GPDR. O mapeamento de todos os processos internos permitirá identificar com maior precisão quais são as áreas mais sensíveis da organização e, consequentemente, onde estão os maiores riscos, no que concerne à proteção de dados, seja de clientes, colaboradores, usuários de sistemas de informação ou aplicações, etc, permitindo que sejam aplicadas restrições ou implementadas melhorias nos controles de acesso a determinadas informações, por exemplo.
2. Integrar as normas de coleta, tratamento e guarda de dados às rotinas internas, como por exemplo:
2.1 No uso de cookies e mecanismos de rastreamento. No caso dos websites de organizações que processam dados pessoais ou que possam ser combinados ou selecionados para identificar determinada pessoa, será necessário revisar os termos de consentimento, possibilitando ao usuário de maneira ativa aceitar ou recusar os vários tipos de cookies antes de prévia configuração, informando de maneira clara por que, como e com que finalidade os dados serão utilizados e permitindo que, a qualquer momento, seja possível ter uma visão completa de todos os cookies ativos e que o consentimento possa ser revogado. Também deve restar devidamente identificado quais dados do usuário são compartilhados com terceiros em razão de aplicações que porventura estejam incorporadas ao seu website. Sob o ponto de vista das obrigações legais, as organizações devem registrar todos os consentimentos dos usuários, armazenando-os de forma segura para que possam ser utilizados como eventual prova. Já existem no mercado soluções que integram a política de cookies ao monitoramento da atividade de cookies em websites, gerando inclusive relatórios mensais sobre o processamento de dados.
2.2 Na retenção de dados. Conforme mencionado anteriormente, o inventário de dados permitirá que a organização livre-se de dados obsoletos, imprecisos e que eventualmente tenham sido processados sem o consentimento dos titulares evitando sua exposição às penalidades previstas pela LGPD. No entanto, com relação aos dados que permanecerão sendo processados é interessante que sejam implementados processos de categorização destes dividindo-os em categorias quanto ao tempo de retenção (curta, média ou longa, por exemplo). Importante salientar que o direito à revogação do consentimento de processamento de dados, por parte de qualquer titular, não pode se sobrepor ou contrariar outras legislações que versem sobre a obrigatoriedade de manutenção de determinados registros.
2.3 Nas práticas de marketing e publicidade digital. A LGPD impactará no engajamento e na relação entre as organizações e seus atuais, potenciais e ex-clientes. A fase de prospecção de vendas, em especial os formulários online e offline e as práticas de e-mail marketing deverão ser revisitados para estarem em conformidade com a nova regulamentação. No caso de aquisição das famosas “listas” com dados pessoais, a organização deverá obter junto ao terceiro coletor, de quem eventualmente as adquiriu, as informações de consentimento adequadas. Até mesmo no mundo B2B, ações simples de networking como a troca de cartões de visita e inclusão das respectivas informações em banco de dados das organizações deverá passar por um processo de revisão e readequação às normas. A coleta de dados comportamentais para potencializar a segmentação de anúncios também passará, fatalmente, por uma reformulação e segundo recente reportagem da Harvard Business Review*, a resposta está na publicidade contextual, ou seja, anúncios serão exibidos não com base no perfil de um consumidor, mas no conteúdo que está sendo visualizado em tempo real.
2.4 Na contratação de empregados e manutenção dos seus dados pessoais. Conforme verificado anteriormente, a LGPD não diz respeito somente à garantia de conformidade para com os dados de clientes e usuários de sistemas de informação de determinadas organizações. Uma área que não deve ser menosprezada na aplicação da nova regulamentação é o Departamento de Recursos Humanos, que coleta e processa dados pessoais de colaboradores (efetivos e potenciais) e terceiros, seja para selecionar, contratar, demitir, pagar, fornecer benefícios, inscrever o profissional em cadastros de órgãos públicos, etc. Neste particular, inclusive, o conceito de consentimento para tratamento e retenção dos dados se confunde com obrigações legais da organização para execução do contrato de trabalho e para cumprir com obrigações legais de ordem trabalhista e previdenciária, por exemplo, motivo pelo qual deve-se encontrar o equilíbrio entre os direitos de privacidade dos colaboradores e a promoção de interesses legítimos da organização no papel de empregadora. Ou seja, é fundamental que os empregados não só tenham plena consciência de suas obrigações, como colaboradores de organizações que processam dados, mas também de seus direitos, como titulares de dados que são processados por seus empregadores.
2.5 Na segurança patrimonial, em especial no uso de câmeras de vigilância. Dado pessoal é uma informação relacionada a pessoa natural identificada ou identificável, portanto vai muito além do nome, endereço, número de telefone, data de nascimento, contas bancárias, registros médicos, etc, de modo que imagens também devem ser tratadas com o mesmo cuidado, mormente se considerado o potencial que câmeras de vigilância conectadas à internet têm de ameaçar as liberdades individuais. Por essa razão, para reduzir significativamente as chances de violação, sugere-se que a empresas invistam em softwares e hardwares seguros para sua vigilância e conectividade de vídeo e que transfiram esse tipo de preocupação a eventuais terceiros fornecedores, operadores de sistemas de alarme, por exemplo.
No próximo capítulo, irei discorrer sobre como cumprir um cronograma interno de treinamento e comunicação.
Para acessar o primeiro capítulo da Série, clique aqui.
Para acessar o próximo capítulo, clique aqui.
* “How GDPR Will Transform Digital Marketing“. Disponível em: https://hbr.org/2018/05/how-gdpr-will-transform-digital-marketing. Acesso em 17. jan. 2019.
por Fernando Henrique Zanoni | 17 jan 2019 | Artigos
Nos três primeiros capítulos da Série “LGPD na Prática”, esclareci quais são as empresas afetadas pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGDP), como manter uma estrutura de governança de dados dentro da organização e como preservar um inventário de dados pessoais e mecanismos de transferência.
No quarto capítulo, irei discorrer acerca de como implementar uma política de privacidade de dados e, mais precisamente, como integrar este tema ao seu Programa de Integridade, redigindo e executando normas que atendam aos requisitos legais e mitiguem riscos operacionais e de danos aos titulares dos dados. Nesta etapa, alguns passos devem ser seguidos:
1. Elaborar ou atualizar a Política de Privacidade de Dados, utilizando linguagem simples e de fácil compreensão, evitando linguagem técnica ou jurídica, considerando seus públicos-alvo, quais sejam, os titulares dos dados e os colaboradores da organização. Em resumo, a Política deve especificar: (i) quais são os dados pessoais coletados pela organização, e quais as suas finalidades; (ii) se são processados dados sensíveis; (iii) como as informações são utilizadas; (iv) qual o sistema de segurança para proteção dos dados; (v) quanto tempo os dados são mantidos em seu banco; (vi) se as informações fornecidas à organização são compartilhadas ou não com terceiros e, em caso positivo, quem seriam essas outras partes; (vii) quem é o Data Protection Officer (DPO), no caso daquelas organizações obrigadas a manter esta função; quem tem acesso e quais processos utilizam-se de tais informações; (viii) de que forma é coletado o consentimento do titular; (ix) como o titular pode ter acesso aos seus dados pessoais para atualiza-los ou corrigi-los; (x) qual o processo para remoção dos dados de sua base ou para promover sua portabilidade; (xi) se os websites e aplicações da organização utilizam cookies; e (xii) se é processada a transferência internacional de dados. No caso de organizações que já possuem uma Política de Privacidade de Dados esta poderá somente ser atualizada, pois muitos aspectos mencionados já são tratados no texto atual, contudo, é uma boa oportunidade para reescrevê-la completamente de modo a melhorar sua comunicabilidade.
2. Redigir ou revisar o Código de Conduta, a Política de Segurança da Informação e outras normas internas, de modo a criar uma maior conscientização entre os colaboradores acerca de questões relacionadas ao processamento e tratamento de dados e alinhar todas as normas com o mesmo discurso e as novas obrigações legais. Avaliar, ainda, a necessidade de criar normas mais específicas diretamente ligadas às novas regulamentações, tais como uma Política de Retenção de Dados.
3. Manter um cronograma de revisão periódica dos principais documentos de integridade. Como o tema da governança de dados ainda é novo, a entrada em vigor da LGPD e a prática diária, especialmente na interação entre as partes envolvidas fatalmente trará a tona a necessidade de atualização das principais normas internas da organização. Nesse sentido, sugere-se que um cronograma de revisão periódica dos principais documentos (Código de Conduta, Políticas e Procedimentos) seja adotado, envolvendo não só o Encarregado de Proteção de Dados, mas também o responsável pela função compliance.
No próximo capítulo, irei discorrer sobre como incorporar uma política de privacidade de dados às suas operações.
Para acessar o primeiro capítulo da Série, clique aqui.
Para acessar o próximo capítulo, clique aqui.
por Fernando Henrique Zanoni | 15 jan 2019 | Artigos
Após verificar quais são as empresas afetadas pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGDP) e como manter uma estrutura de governança de dados dentro da organização, temas que foram trabalhados nos dos dois primeiros capítulos dessa série, passo a abordar como preservar um inventário de dados pessoais e mecanismos de transferência de dados.
Neste particular, sugere-se que as seguintes etapas sejam observadas:
1. Manter um inventário de dados pessoais e das atividades de processamento. Primeiramente, é necessário saber onde estão os dados pessoais. Para tanto, realiza-se uma auditoria (discovery), na qual é identificado como são coletados e onde são armazenados os dados (se em bancos estruturados ou não-estruturados), para onde estão sendo enviados, quanto tempo são retidos e em que formatos, quem tem acesso e está os utilizando, quem é o responsável e qual a sua relevância. Esta, certamente, será a etapa mais trabalhosa e demorada de todo o processo de adequação da organização à LGPD, pois devem ser considerados não só os servidores locais e de terceiros, mas também as nuvens públicas e privadas, mídias sociais e sites de compartilhamento, além de soluções híbridas que agregam todas as anteriores. Após este estágio, é provável que a organização verifique que detém dados pessoais irrelevantes, obsoletos ou redundantes, momento em que, sugere-se, sejam estes removidos de sua base, de modo a reduzir custos com o armazenamento, melhorar a indexação, dar mais rapidez ao acesso e ao tempo de recuperação na eventualidade de algum infortúnio e, sobretudo, diminuir os riscos.
2. Classificar os dados pessoais por tipo, de acordo com o seu conteúdo, preferencialmente utilizando, num primeiro momento, a categorização proposta pela própria LGPD (dado pessoal, dado pessoal sensível, e dado anonimizado). Isso ajudará a empresa a criar as políticas de armazenamento, garantir que os dados só sejam efetivamente acessados e compartilhados por pessoas com as devidas permissões e propor soluções de proteção, como criptografia e data loss prevention (DLP), e contra vazamento, dando mais controle sobre as informações que circulam no ambiente da organização e fora dele. Quando possível, a classificação de dados será inserida em metadados de arquivos, permitindo que essa informação trafegue com eles, informando automaticamente a aplicativos de terceiros e usuários como os dados devem ser manipulados.
3. Reter registros dos mecanismos de transferência de dados entre servidores localizados em diferentes países, nos casos de empresas que operam globalmente, distribuem seu armazenamento em nuvem ou utilizam-se de tecnologias como a blockchain, por exemplo, respeitando as previsões legais do Capítulo V da LGPD, em especial seu artigo 33. Nesse sentido, a título de salvaguarda, recomenda-se sejam revistos : (i) os contratos firmados entre organizações controladoras e processadoras de dados de modo que as obrigações de ambas estejam em consonância com as normas internacionais, ou seja, que sejam dadas garantias de que o tratamento dos dados e o nível de proteção respeitarão o disposto na LGPD e em outras leis aplicáveis; (ii) no caso de multinacionais, as regras corporativas globais gerais, tais como código de conduta e outras políticas, e específicas, que regulamentem a transferência e processamento de dados pessoais entre empresas do mesmo grupo econômico; (iii) os termos de consentimento firmados pelos titulares dos dados. Recomenda-se que empresas que trabalhem com um volume muito grande de dados e processos complexos de tratamento e, principalmente, transferência, busquem certificações ou selos de modo a demonstrar seu compromisso para com as principais normas internacionais.
No próximo capítulo, irei discorrer sobre como implementar uma política de privacidade de dados.
Para acessar o primeiro capítulo da Série, clique aqui.
Para acessar o próximo capítulo, clique aqui.
por Fernando Henrique Zanoni | 11 jan 2019 | Artigos
No primeiro Capítulo da Série “LGPD na Prática” ficou claro que a grande maioria das empresas será afetada, direta ou indiretamente, pela nova regulamentação brasileira em virtude dos novos direitos dos usuários titulares de dados, o que fez surgir, por conseguinte, inúmeras obrigações legais a serem respeitadas por essas organizações dentro do prazo estabelecido, ou seja, até 15 de agosto de 2020.
À primeira vista, o prazo legal para adequação à norma pode até parecer elastecido, contudo uma análise mais apurada não só dos encargos legais, mas, principalmente, da realidade das organizações, mostra a necessidade de se iniciar imediatamente um projeto estruturado para harmonização de suas operações às novas regras.
Por tais motivos, destaquei primeiramente a necessidade das empresas de manter uma estrutura de governança de dados, ou seja, certificar de que existem na organização pessoas responsáveis pela privacidade e gestão dos dados e procedimentos para reporte de incidentes.
Para tanto, sugere-se sejam seguidos os seguintes passos:
1. Nomear um Encarregado de Proteção de Dados (DPO – Data Protection Officer), responsável por supervisionar a estratégia e a implementação da proteção de dados para garantir a conformidade com os requisitos não só da LGPD, mas de outras normas internacionais as quais a empresa eventualmente esteja submetida, recebendo, processando e solucionando as reclamações e comunicações dos titulares de dados e da autoridade nacional e orientando colaboradores e terceiros a respeito das melhores práticas no que tange ao tratamento e processamento de dados pessoais. Ou seja, sua função será a de educar sobre os requisitos de conformidade, treinar todos os envolvidos, realizar auditorias regulares de segurança, manter registros abrangentes de todas as atividades e atuar como interface entre a organização, os titulares dos dados e a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD). A norma não inclui uma lista de credenciais para o DPO, mas recomenda-se fortemente que seja um profissional, ou uma empresa, que tenha conhecimento especializado de leis e práticas de proteção de dados, que esteja alinhado com as operações , a infraestrutura e os sistemas de tecnologia da informação da organização e, principalmente, que conheça os riscos envolvidos neste particular, considerando as especificidades do negócio e da empresa. Idealmente, o DPO deve ter habilidades de gerenciamento e capacidade de interagir com a equipe interna, terceiros, titulares de dados e órgãos oficiais. É necessário que as informações do DPO sejam públicas e fornecidas a todas as agências de supervisão regulatória.
2. Envolver a Alta Administração e a Gerência Sênior da organização, pois assim como em um Programa de Integridade, a adequação à LGPD exige buy-in do corpo diretivo e dos principais líderes, de modo que todos devem compreender os riscos cibernéticos a que qualquer empresa está exposta, além de estarem alinhados às estratégias e objetivos das normas internas relacionadas ao processamento e tratamento de dados . Nesse sentido, recursos suficientes devem ser alocados para desenvolver, implementar, manter e melhorar os respectivos controles internos e sistemas de segurança da informação. A apresentação de reportes periódicos às partes interessadas sobre o status do processo de adequação a LGPD, neste particular, é fundamental. Nesse sentido, sugere-se que o tema seja debatido de forma recorrente em fóruns da alta direção, tais como reuniões do Conselho de Administração ou Diretoria para que se garanta que o órgãos máximos de gestão mantenham supervisão suficiente com linhas de subordinação e prestação de contas clara, a fim de demonstrar conformidade com as normas.
3. Atribuir responsabilidades pela privacidade dos dados em toda a organização. A nomeação de um Encarregado de Dados não o transforma no único responsável pelo tema dentro de uma corporação. É importante entender que existem departamentos que colhem e tratam dados pessoais periodicamente, tais como recursos humanos e marketing, para citar dois dos principais. Deste modo, os gestores dessas áreas devem estar amplamente envolvidos com o cumprimento da política de privacidade de dados e das obrigações legais advindas da LGPD. Recomenda-se, neste particular, que no próprio job description de profissionais dessas e de outras áreas que tenham contato direto com dados pessoais sejam incluídas obrigações relacionadas à observância das normas internas e externas.
4. Implementar processos de comunicação regular entre todos os envolvidos, pois uma das mudanças mais importantes que a LGPD trouxe é a obrigação das organizações de relatar em tempo razoável toda violação de dados. Procedimentos bem definidos de interação entre o Encarregado de Dados e os colaboradores, terceiros que eventualmente prestem serviços de processamento ou tratamento de dados, titulares e autoridades regulatórias devem ser sistematizados em um plano de comunicação de crise, tendo em vista o exíguo tempo para apuração e remediação de tais situações e, principalmente, os riscos reputacionais de vazamento da informação dessa , o que acarreta na imperiosa necessidade de preparar declarações reativas para tratar o assunto, em especial no caso de marcas e empresas conhecidas.
5. Realizar periódicas avaliações de riscos, de modo a criar uma conscientização quanto às possíveis consequências de uma violação e a importância de aprimorar os controles e sistemas de segurança cibernética, políticas e procedimentos de governança de dados. É importante verificar se as medidas técnicas e organizacionais adotadas pela empresa e por terceiros que eventualmente processem ou tratem dados para esta, são suficientes para proteger a confidencialidade, integridade e disponibilidade dos dados. Por isso, testes de penetração regulares de sistemas de TI e de restauração do acesso a dados pessoais no caso de violações, além da revisões das melhores práticas e de novas tecnologias para mitigar o impacto de potenciais problemas, são interessantes ferramentas de auxílio ao aperfeiçoamento das estruturas de salvaguarda. E, se num primeiro momento, as organizações possam vir a assumir que os únicos riscos que enfrentam são de invasões ou roubo de dados, é importante ressaltar a responsabilização das empresas no caso de destruição, perda ou divulgação acidental ou ilegal dos dados o que vai muito além de simples ataques de hackers.
No próximo capítulo, irei analisar a importância de se preservar um inventário de dados pessoais e definir os mecanismos de transferência de dados.
Para acessar o primeiro capítulo da Série, clique aqui.
Para acessar o próximo capítulo, clique aqui.
Comentários